Outra vez conversaram meus olhos e teus óculos. Digo os óculos, pois nós sabemos que eles estão de tal modo pegados ao teu rosto que seria uma estranheza falar de forma diferente. Andei mesmo pela rua do medo, fiz adendos na madrugada. Havia na calçada um galpão de estacionamento, dentro dele a minha voz acendia e eu sorria, investindo no ato de nada reconsiderar. Um não bem dito (bendito!) contra o corpo de um amigo é remédio contra o vulgar. (Ei moço, me arruma uns fósforos? Deram-me uma caixa inteira)... Duas eu acho. Três da Gal. Quatro dos galos. Cinco dos sinos. Seis dos pães já prontos da padaria. Sete do sol medonho, melindrado. Oito do sim-é-dia, e só depois é que a noite desenssimesmará. Então, tu me dizes, delicada perversidade, saltinhos cor de poeira e manso coração-mirrado: "é desespero isso de andar pela cidade". Sou obrigada a te cumprimentar. "Há um excesso de verdade no mundo" - disse Raduan para uma galinha que ciscava, descompromissada, a terra do sitio - El Dourado de quem cansou dos ornamentos do circo. Depois ele desistiu, digo o Raduan. Assim, peço: não me ofertes o teu excesso de verdade, me deixa apenas a falta dela, essa mãe-d'água que nunca promete graça, milagre ou proteção. Não ouses furtar as minhas dores, foi muito difícil encontrá-las no Mercado Livre. Mas por que as cegonhas não são igualmente responsáveis pelo recolhimento dos bebês mortos? Tu, pela primeira vez em tua vida, tocas de leve as linhas da minha vida na palma honesta da minha mão, entrega-me um livro vermelho/branco: "Poesia da Recusa". Eu sei o que significa o livro, gente morta pra eu pôr no teu lugar
De que livro tu tiraste esta verdade?
quinta-feira, 19 de novembro de 2015
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Ângela Calou
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domingo, 28 de junho de 2015
- Ao Jack
- Quero, coração, esquecer-te como os vivos se esquecem dos mortos; como o eterno se esquece do fim. Quero esquecer-te como o poeta que desiste de sua lavra para olhar um pouco mais a ferida, antes de prendê-la numa sílaba; a vida, antes de salvá-la numa palavra. Quero, coração, esquecer-te como o poeta que faz um verso torto e, para não morrer de desgosto, deixa irromper seu desagrado. Quero, coração, amassar com as duas mãos o teu composto: este rascunho equivocado! Este brinquedo de fazer troça!... Eu quero, coração, embora tu bem saibas que eu não possa...
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Ângela Calou
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sábado, 9 de maio de 2015
faz-lhe massagem com mãos de mágoas; oferece-lhe sem pavor o catálogo de tua dor, acrescido de um copo d'água. Prescruta-lhe bem os motivos, até que o ridículo da vida cave em ambos um riso... que como apito de trem, fim da visita anuncia - amém!
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Construção da Alegoria - do amigo Nagib Jorge Neto
sábado, 21 de fevereiro de 2015
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Ângela Calou
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Amoximoro II: o belo terrível
domingo, 18 de janeiro de 2015
Em matéria de amor
eu, doutor em chagrisse
Pedrinho de petitices
misto de lobo e pastor
Se o assunto é amor
Se o assunto é amor
não me peças conselho
sobrolhos em pesadelo
mais fácil falar shikomor!
Vindo o amor na calçada
Vindo o amor na calçada
atravessa, desce a escada
salta-te logo debaixo d'água
Sê avarento de sentimento
poupando teu coração desta
inútil sedição de tormento
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Ângela Calou
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